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A Caixa do Cayuguava - Velha

['A Caixa do Cayuguava - Velha]

Como já escrevi em outro relato sobre as descobertas que fiz nos Mananciais da Serra, minhas “ferramentas de pesquisas” eram um mapa dos mananciais da década de 80, fornecido pela Ana Cristina funcionária da Sanepar,  e as preciosas informações do Senhor José Rocha de Barros, Seu Zezinho (já falecido) como era conhecido lá no Morro do Canal.

 

Seu Zezinho por mais de 40 anos trabalhou nos Mananciais. Era uma fonte preciosa de informações sobre o funcionamento do sistema e sobre a localização das estruturas.

 

Depois de ter encontrado as represas próximas ao reservatório de acumulação – Reservatório do Carvalho - comecei a buscar as represas que ainda não havia descoberto: Polenta, Mico e Cayuguva Velha.

 

Sobre a descoberta da Caixa do Mico, já relembrei a aventura do encontro em outro relato neste site (A Descoberta da Caixa do Mico). Relato a seguir o roteiro da descoberta da Caixa do Cayuguava Velha.

 

Em uma ida até o Morro do Canal e conversando com o Seu Zezinho, perguntei como poderia chegar até a “Velha”. Seu Zezinho já não lembrava o caminho original que levava até essa represa, pois quando ingressou na Departamento de Água e Esgotos DAE (ainda não denominava-se Sanepar) em 1945, essa represa não fazia mais parte do sistema de captação há muitos anos.

 

Mas em algum momento de sua permanência nos mananciais deve ter chegado até próximo dela ou topado com alguma estrutura, pois me deu uma dica da qual não me esqueci até hoje.

Após a entrada da trilha para a Caixa do Uru, seguindo pela estrada do Ipiranga tem uma pequena subida, sua dica foi: “....passando o carreiro da Caixa do Uru, depois da subida, quando a estrada tem uma pequena reta, olhe para o lado esquerdo. Tem um pinheiro no meio do mato. A represa fica perto do pinheiro...”

 

Escrevendo assim parece fácil de achar... Mas na realidade não foi!

No dia 11 de Agosto de 2012 fui até os mananciais. O dia estava nublado e no horário que cheguei mais ou menos no ponto indicado pelo Seu Zezinho na estrada do Ipiranga, ainda tinha serração. Tentei com dificuldade vislumbrar a copa de alguma araucária, mas estava difícil de enxergar a media distancia.

 

Num determinado momento, olhando para o horizonte, achei ter visto galhos de pinheiro ou algo parecido. Foi o gatilho para entrar na mata fechada, tentando seguir na direção do que tinha avistado. Acabei achando o pinheiro. Parte da busca estava realizada. Escutando barulho de água e sabendo que este som só poderia ser proveniente do rio Cayuguava, tentei encontrar o curso de água. Com risco de me perder desisti em função da mata ser muito fechada, retornando ao local do pinheiro.

 

Fiz uma segunda tentativa, agora para o lado oposto da primeira investida, o que foi correto, pois cheguei numa “valeta”, com uma das paredes em alvenaria. Imagine, no meio do mata fechada, achar uma parede?

 

Na primeira observação do novo achado, me pareceu uma espécie de saída de água que normalmente encontramos em açudes. Bom, pensei, a represa está por perto, pois o som de água havia aumentado. Mas o barulho vinha de local além da “valeta”.

 

Utilizando cipós e com extremo cuidado, consegui transpor essa vala. Descendo uma pequena elevação descobri outra “construção” que na primeira visualização não dava para ter a menor idéia do que havia encontrado, apenas que possuía uma abertura por onde saia água. Era a origem do som que ouvira antes no meio da mata.

 

Não é possível imaginar para quem está lendo esta estória, o visual que eu estava tendo naquele momento. O entorno era formado por pequenas árvores, muita bambu e taquaras, capim alto, nada denotando o que estava por ser descortinado.

 

Com dificuldade e abrindo caminho por entre as taquaras, consegui transpor o córrego abaixo do local de onde a água saia. Removendo as trepadeiras, acabei descobrindo ser uma estrutura de tijolos, com uma grande murada de granito nos fundos. A caixa do Cayuguava  Velha tinha sido encontrada. Pelo menos foi o que pensei por longo tempo. O “córrego” na verdade, era o rio Cayuguava.

 

A primeira foto desta achado foi tirada às 14h28min de um dia nublado do mês de Agosto de 2012.

No retorno pelo mesmo caminho da entrada desci no fundo da vala, descobrindo que no inicio desta estrutura havia uma comporta já destruída, que era movida por um tipo de cremalheira. A vala era uma boa descoberta, mas ainda sem entender sua funcionalidade.

 

Como a vegetação para além da murada era muito cerrada, naquele dia e por muito tempo não tive ânimo para efetuar nova incursão para o outro lado, pois nos meses seguintes, com o clima quente o local era muito favorável a encontro com as jararacas.

 

Depois desta primeira descoberta, estive com o Seu Zezinho, mostrando a ele fotos da vala. Para minha surpresa ele não conhecia essa estrutura. Deduzi que sua ida até o local teria sido por outro caminho, não tendo acesso a vala. A própria vegetação poderia ter escondido a estrutura.

 

Nesse período também compartilhei o achado com a amiga Ana Cristina, que sempre apoiou muito as pesquisas.

 

Voltei a esse local mais algumas vezes, porém sem disposição de enfrentar a mata para descobrir o resto da estrutura. Só em setembro de 2013 fiz a maior descoberta de todo o período de pesquisas nos mananciais.

 

Decidido a ir para o outro lado da murada descoberta no ano anterior, fiz uma pequena trilha para além do rio Cayuguava, no lado oposto do qual fazia o acesso ao rio, logo depois da passagem da vala. Ao cortar uma taquara, o meu pequeno facão bateu em uma pedra. Estranhei o formato da pedra, pois era plana. Afastando a vegetação descobri ser um muro de granito.

Lembram na descrição acima, que após ter transposto a vala no ano de 2012, tinha descido uma “pequena elevação”? Pois essa elevação, na verdade era a outra parede de granito. Eu estava DENTRO da caixa do Cayuguava Velha.

 

A adrenalina foi às alturas. A parede de granito que havia descoberto no ano anterior, na verdade era a parede de entrada água na caixa. Com dificuldade e abrindo uma trilha ao lado do rio, consegui encontrar a murada da barragem. Passando para o outro lado dessa murada, tive a real visão da grandeza dessa estrutura. Tinha finalmente descoberto a maior represa do complexo de captação de água dos Mananciais da Serra.

A foto dessa murada foi tirada as 09hs02min do dia 15 de Setembro de 2013.

 

Foi uma sensação única e curtida na solidão, apenas na companhia dos sons da mata e o barulho das águas do Rio Cayuguava.

 

Mais um ano passou e em Setembro de 2014, finalmente toda a grandeza arquitetônica da barragem foi revelada, após a “turma da roçada” composta pelos amigos Claudinei e Nico terem efetuado a limpeza do local.

 

Levei até esse local o Sr. Dirso Pinto de Barros, filho do Seu Zezinho e que também morou e trabalhou nos mananciais. Apesar de ter vivido por longo tempo na serra, não conhecia o local. Desta forma prestei uma homenagem à memória de seu pai e que também era um grande amigo.

 

Após estas descobertas, realizei pesquisas nos documentos antigos, tendo identificado que a caixa havia sido abandonada em 1918, com a construção de nova barragem no rio Cayuguava, no local que está até os dias de hoje. O motivo da desativação foi a descoberta de uma área de lodo a jusante da caixa, o que tornava a água avermelhada e imprópria para o consumo humano.

 

Quanto a vala, também descobri que fora construída em 1909 e era um sistema que ajudava na vazão do rio Cayuguava, nos período de grande fluxo de água, possivelmente após as chuvas. Nos documentos essa estrutura era denominada como Vala Empedrada.

 

Também através de uma fotografia de 1907, descobri a existência de uma casa acima da represa, antes da vala, da qual posteriormente descobri as fundações....mas esta é uma outra estória.

Na foto do destaque, a primeira foto do descobrimento em 2012.

 

Piraquara, 10 de Junho de 2020.