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Jornal Diário da Tarde

Transcrição da Edição de 14/03/1907 - Pg. 2

 

                               Secção Alheia

                                Saneamento

      Uma explicação

     De passagem para o Rio de Janeiro tive ocasião de lêr na “Republica” de 8 e 9 do corrente, um artigo de fundo e uma noticia em que repetidamente se falla em meu nome procurando-se envolvel-o n’uma atmosphera de calumnia e de infâmia.

     Herdeiro de um nome sem mancha e zeloso em conserval-o sempre acima de todas as suspeitas, juguei de meu dever, antes de deixar para sempre esta terra, dizer com sinceridade aos que me lerem qual a minha verdadeira situação em toda esta malfadada questão de saneamento.

     Quando em Novembro de 1905 eu me retirei definitivamente de Curityba, onde durante anno e meio estive a testa dos trabalhos da Empresa, entrei em um accordo com o dr. Alvaro de Menezes em data de 10 de Janeiro do anno seguinte, accordo pelo qual eu me eximia por completo de toda e qualquer responsabilidade futura nos negócios da Empresa, acautelando recíprocos interesses e ficando eu com o pleno direito de solicitar, quando entendesse, do Governo do Estado a retirada do meu nome do contracto de saneamento.

     Por motivos de ordem reservada não o fiz até hoje. Entretanto estes factos são do domínio publico e nem um dos membros do Governo os ignora.

     Ultimamente, há cerca de 20 dias, solicitado pelo dr. Alvaro de Menezes, não me pude negar as seu pedido de vir em meu nome me entender com o Governo do Estado afim de regularizar definitivamente a situação da Empresa perante o Governo, resolvendo as questões pendentes e chegando a um accordo que acautelasse os múltiplos interesse em jogo.

     Vim, e, com a boa vontade e a sinceridade de que são testemunhas os próprios membros do Governo, ali estive 10 longos dias em continuadas conferencias ora com o dr. vice presidente, ora com os seus secretários.

     Devo com lealdade dizer que a aetitude francamente hostil do Governo em relação à Empresa difficultou e impossibilitou a minha missão por completo.

    Por ocasião de minha chegada fui procurado pelo Sr. Thaty que me disse ser credor do Sr. Ed. Simonds de avultada quantia por serviços feitos na Serra por ordem e conta do mesmo.

    Bondosamente o ouvi e, embora a minha missão em Curityba fosse muito outra que não a de fazer pagamentos a pessoal, cujos serviços, cujas contas e cujos contractos desconheço inteiramente, procurei promover entre aquelles srs., accordo a que não se chegou emquanto ahi permaneci.

     O sr. Thaty pedia ao sr. Simmonds 2 contos de reis para ultimar os pagamentos de seu pessoal. Esse dinheiro, accrescido de mais algum para as minhas despezas, me foi remettido pelo dr. Alvaro de Meneses, a meu pedido.

    Quinta-feira, 7, eu o retirei do Banco Commercial, e na noite desse mesmo dia, pessoa de minha amizade preveniu-me de que o pessoal, que estava em greve pacifica desde o dia 5, estava disposto a promover conta mim uma manifestação de desagrado, caso eu não satisfizesse o pagamento imediato dos seus salários.

    Devo dizer que é absolutamente falso que eu me houvesse compromettido com quem quer que fosse a fazer esse pagamento. Nem o dr. Alvaro de Menezes me autorizara a declarar semelhante coisa, nem eu de motu-proprio poderia me envolver em assumpto que não me dizia respeito. Na emminencia de ser uma victima innocente no desenlace de uma situação afflitiva, que não fora creada por mim e cuja responsabilidade só um louco poderá me attribuir, desanimado por outro lado de conseguir do governo um accordo acceitável, julguei mais acertada minha partida para o Rio, onde deporia nas mãos do dr. A. de Menezes os poderes que elle tão generosamente me confiara, para que elle ou viesse defender pessoalmente os interesses da Empreza ou os entregasse a mãos mais haveis e a inteligência mais lucida.

     Nessa decisão, julguei que não devia mais entregar somma alguma a quem quer que fosse; esse dinheiro não era meu e pelo facto de ser alheio eu não podia dispor delle a meu bom grado. Assim entendi e assim o fiz. E isso mesmo eu disse ao sr. Thaty na manhã da minha partida e elle me confirmou a noticia de uma manifestação do pessoal contra mim.

     Estou bem com minha consciência. E “A Republica” que tão levianamente se atira à dignidade e à reputação alheias, orgam offical de um partido que exerce o governo, e que, como tal, deveria dar o exemplo da ponderação, da reflexão e do critério, abre um precedente perigoso em suas columnas. É simplesmente monstruoso eu se queira fazer acreditar que eu tenha sido capaz de me apoderar de 3 (três!) contos de réis que não me pertenciam!

    Para que esse jornal faça esse juiso de pessoas cuja honestidade e cuja honra tem o dever de respeitar (para não ser relegado à condição de corsário e de pasquim) é mister que elle forme das pessoas que o cercam, dos seus amigos, do meio em que vive, de si mesmo a mais miserável das opiniões.

    Em que triste tempos nós vivemos! E praza a Deus que essa lama sobre ,i, “A Republica” tão desairosamente quiz jogar, não recáia sobre quem de direito a merecer...

     E “A Republica” póde continuar em sua campanha...

     Paranaguá, 12 de Março de 1907.

                                                                       Octaviano Machado.