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Jornal Diário da Tarde

Transcrição da Edição de 24/02/1912 - Pg. 1

 

       Uma interview – Fala o dr. Goulin – S.a. visitou os reservatórios da serra.

       A população coritibana vem se preoccupando immensamente com a questão da agua. Elemento capital na sua economia vital, justa a cautela do povo.   Como se tivesse feito, da parte dos poderes públicos, pesado silencio em torno da questão, o Diario tratou de agitar o caso.

      Assim, sabendo que illustres profissionaes fizeram uma excursão, em caracter particular, aos mananciaes da serra, resolveu mandar um seu prepresentante falar com um deles.

        Foi o que se fez.

         O dr. Goulin recebeu amavelmente o nosso repórter, estabelecendo-se o seguinte dialogo:

       Rep. – Sabe o illustre dr. que ultimamente muitas pessoas tem deixado, na nossa redacção, em vidros, animaculos saídos das torneiras do encanamento da agua. A população justamente atemorisou-se. Nosso jornal, fazendo-se eco das reclamações, chamou a attenção dos competentes para o caso.

        Ninguem providenciou e, como está no nosso conhecimento que v.sa., em companhia do dr. medico municipal, fez uma visita aos reservatórios, desejaríamos ficar a par do resultado das suas observações.

         Eng. – Realmente, acompanhei o dr. Assis Gonçalves na visita que fez, não só as obras de captação, na Serra, como também ao reservatorio daqui e a rede distribuidora, e estou prompto a dizer, com toda a franqueza, o resultado das observações que fiz com o digno medico municipal e com o dr. Carrão, que também nos acompanhou.

       Sendo o objetivo principal do dr. Assis Gonçalves procurar a origem dos animaezinhos a que se refere e examinar, egualmente, o meio em que se desenvolviam; e sabendo elle que eu tinha, no período da construcção, trabalhado como engenheiro da actual empreza, convidou-me para acompanhal-o e indicar-lhe os meios de fazer um exame completo.

       Rep. – Encontrou v.s. muitos desses animaezinhos?

     Eng. – Iniciamos nossas pesquisas na rede de distribuição, na cidade – rede esta dividida em diversas zonas, por meio de registros convenientemente collocados.

      Essa divisão tem por fim poder-se isolar uma das zonas, sem prejuízo do fornecimento de agua às demais, para qualquer concerto e para sua limpesa. Cada zona, no seu ponto mais baixo, tem uma descarga para os esgotos ou para os rios que atravessam a cidade.  Pois bem, foi numa dessas zonas que determinamos uma dessa manobras de descarga.

        Rep. – Serão trazidos pelas aguas dos rios que estão canalisados, ou crear-se-ão nos próprios tanques?

       Eng. – A impressão que tivemos não podia ser peor e só poderia indicar a falta de limpeza dessa zona, desde muitos mezes, annos talvez. O representante da empreza estava presente e, certamente, não deixará de atender à determinações que lhe foram feitas, pelo medico municipal, para uma limpeza geral, desde já, e sobre os períodos de limpeza das diversas zonas, podendo, sem indiscrição, adiantar que serão fixados publicamente, pois acarretarão a suspensão do fornecimento de agua à zona que se estiver descarregando, durante essa limpeza.

     Não era de admirar que, num meio desses, se desenvolvessem os animaezinhos e conhecendo-se bem as pennas d’agua, collocadas em cada derivação domiciliar, e só tendo um orifício diminuto, correspondendo-se a outros nos quaes, com alguma difficuldade, podem passar esses corpos tão flexíveis, pelo numero dos que já conseguiram passar até nas torneiras, - pode-se avaliar qual a quantidade que pode existir na rede de distribuição e a conveniência da medida determinada.

      No reservatório de distribuição, foi-nos declarado, pelo representante da empresa, que os dous compartimentos eram limpos mensalmente, como essa limpeza tivesse sido feita poucos dias antes da nossa visita, nada encontramos de anormal.

       Na serra, visitamos minuciosamente os pontos de captação dos diversos mananciaes, desde o “Carvalho” até ao “Cayguava”. A agua, à exepção do “Urú”, estava bem carregada, devido à chuva, na véspera. Encontramos, junto à rede que protege a sahida das aguas do “Salto”, um desses animaezinhos, tendo-nos declarado o residente da serra não ser o primeiro que encontra, nesse e nos demais mananciaes.

      Devem ser trazidos pelas aguas porque tem sido encontrados em pontos onde ellas não param, sendo provável que nem todos venham com o tamanho com que são encontrados  aqui, desenvolvendo-se na própria agua.

       Rep. – No caso affirmativo da primeira parte da nossa pergunta, desde que a agua ofereça meio propício, à formação delles  não será prejudicial à saúde?

     Eng. – É uma pergunta delicada e que escapa à minha competência. Só poderia respondel-a a deante do resultado de uma analyse chimica e bacteriologia de cada uma das aguas fornecidas à população.

      Rep. – Mas, não existem já essas analyses?

     Eng. – Que eu saiba só foi analysada, há muitos annos, a do “Carvalho”, não o sendo as dos demais mananceaes.  Foi muito satisfactoria analyse chimica, mas não foi feita a bacteriológica.

       Rep. – Para obviar a inconveniência e a iminência de se ingerirem esses corpos estranhos, qual a medida mais prompta?

      Eng. - A medida mais prompta, e deante da qual não há recuar, é a construcção de filtros, na serra. Constituirão não só para reter a terra que a agua traz em suspensão, depois das enxurradas, como também para impedir a vinda, para a cidade, desses animaes, etc. E, enquanto não ficarem promptos os filtros, muita limpeza: limpeza na serra, descarga da linha adductora, lavagens frequentes do reservatório do Alto de S. Francisco e limpeza da rede de distribuição. Isto, quanto à empreza. Quanto aos particulares, limpeza dos seus pequenos reservatórios domiciliares.

      Rep. – E um filtro, assim, poderá ser montado facilmente?

      Eng. -  Com relativa facilidade, pois o material filtrante encontra-se muito delle na serra mesmo, como sejam a pedra e a arêa.

     Quanto à obra de alvenaria, a principal está feita, pois bastará adaptar para filtro estabelecendo os necessários compartimentos, a grande caixa construída no “Carvalho”, pela primitiva empresa, e que só poderá ser utilisada para este fim, pois que o plano de armazenar a agua na serra não tem cabimento, uma vez que só ser reserva agua na cidade.

     Rep. – A sua visita foi de mera curiosidade, bem o sabemos, mas a sua opinião sobre o assumpto é valiosa, tanto mais que v.sa. seguiu com o dr. Assis Gonçalves. E se não for indiscreção, em resumo, que pensa esse illustre medico sobre o caso?

    Eng. – Creio não ser indiscreção afirmar que esse illustre medico pensa de accordo com as observações que acabo de resumir e que são, mais ou menos, o resultado da troca de opiniões entre nós dous e o illustre dr. Carrão.

    Não considero a filtração a medida única e idispensavel. Muito necessário será resolver a questão da derrubada de mattas, contra a qual me voto desde que trabalhei aqui em Coritiba, pela primeira vez, tendo tido o praser de ver o Diario trabalhar no mesmo sentido. Tomadas todas essas medidas, Coritiba poderá ficar tranquilla, enquanto não apparecer o problema da falta do liquido nas seccas.