Autor: |
José Carraro |
Titulo: |
Caixa Tangará |
Data da foto: |
11/03/2025 |
Categoria: |
Caixas de Captação |
Sub-Categoria: |
N/A |
As pesquisas sobre a caixa Tangará foram exaustivas. Para melhor contar a trajetória de minhas investigações, vou registrar as citações que encontrei desta represa nos documentos pesquisados, e na sequência, a cronologia das pesquisas de campo.
Nas descrições dos documentos antigos, a partir de 1906 e até o ano de 1917, a citação de uma caixa/represa denominada como Tangará era frequente, inclusive com informações do volume de água medido no vertedouro da barragem (1910).
O nome “tangará” pode estar relacionado a ave Tangará Dançarino (Chiroxiphia caudata), com avistamento bastante frequente nos mananciais da serra.
1906
- 13/03 - Jornal Diário da Tarde pg.1:
”...Os ribeirões aproveitados para o abastecimento d’agua são os seguintes: Caiguava, Salto, Urú, Mico, Tangará, Braço do Carvalho e Carvalho”.
Outras publicações com relatos da caixa Tangará:
- 14/03 - Jornal Diário da Tarde pg. 1;
- 14/04 - Jornal A República pg. 1 (duas citações);
- 15/10 - Jornal A República pg. 1;
- 31/12 - Relatório da Secretaria de Obras Públicas e Colonização.
1907
- 22/01 – Jornal Diário da Tarde pg. 1:
“... as represas do Carvalho, Braço e Caiguava na Serra, e em vias de conclusão a pequena represa do Tangará”.
Outras publicações com relatos da caixa Tangará:
- 01/04 – Jornal A Notícia pg. 1;
- 13/04 – Jornal A Notícia pg. 1;
- 14/11 - Jornal Diário da Tarde pg. 1;
- 25/12 – Jornal A República pg. 1;
- 31/12 – Secretaria de Obras Públicas e Colonização (duas citações).
1908
-18/09 – Jornal Diário da Tarde pg. 2:
“...Assim, foi inaugurado officialmente a ligação das reprezas do “Tangar”, “Mico”, “Braço do Carvalho” e “Carvalho” ...
Outras publicações com relatos da caixa Tangará:
- 02/10 - Jornal A República pgs. 1 e 2;
31/12 - Relatório do Secretario dos Negócios de Obras Públicas e Colonização (2):
“...Todos os mananciais captados acham-se situados na Serra do Marumby e são os seguintes: Carvalho, Braço do Carvalho, Tangará, Mico, Cayguava, Salto, Urú e Carambola”.
“...Estão concluídas e funcionando as do Mico e Tangará, achando-se todas as reprezas providas de registros de ligação às linhas aductoras, aqueductos e de descargas”.
1910
- 31/12 - Secretaria de Estado dos Negócios de Obras Públicas e Colonização:
“...limitando-se a captar os mananciaes dos rios Carvalho, braço Carvalho, Cayguava, Mico, Tangará, Urú e Salto...”
Tangará
Dia 12 Outubro 40608 litros
Dia 12 Novembro 99360 litros
Dia 19 Outubro 86400 litros
1913
31/10 – Jornal Diário da Tarde pg. 2:
“...Os trabalhos a que se refere a clausula antecedente, são os seguintes: captação do riberão “Salto” e aproveitamento, pelos meios convenientes, dos mananciais do “Carvalho”, “Braço do Carvalho”, “Tangará”, “Mico”, e “Cayguava...”
1916
31/12 - Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda, Agricultura e Obras Públicas do Exercício de 1915 – 1916:
“...Volume fornecido pelos mananciaes Carvalho, Braço do Carvalho, Carambolas, Tangará, Mico e Cayguava...”
1917
31/12 - Secretaria de Estado da Fazenda, Agricultura e Obras Públicas, Exercício de 1916-1917:
“...revestimento das represas do Cayguava, Mico e Tangará...”
A partir de 1917 a represa Tangará não é mais citada como fonte de captação nos mananciais da Serra.
As minhas pesquisas de “campo”:
2012 - Descoberta de parte de uma adutora de pedra ou granito em novembro, que mais tarde descobri ser o traçado dessa linha adutora que constava no mapa de 1929, a qual foi construída entre 1919 e 1920, para fazer a adução da água da nova represa do Cayguava.
Com a construção dessa “nova” linha adutora em 1920, acabei deduzindo que as captações que estavam abaixo do local por onde passou a adutora de granito, foram desativadas. Essa linha da adutora é crucial para entender o local onde a Tangará poderia estar.
2013 - Nesse ano, mais precisamente no mês de julho, encontrei uma pequena caixa ou represa na orla da trilha do Salto, nas proximidades da Casa do Zelador, hoje conhecida como Casa da Memória. Na época, havia pensado ter encontrado a furtiva caixa Tangará. Porem as descrições dos documentos antigos, citavam as captações na seguinte ordem: Carvalho, Braço do Carvalho, Mico, Tangará e Cayguava. Não indicavam que poderia estar para os lados do Ribeirão do Salto.
Ainda no mês de outubro fiz a descoberta de uma “calha de alvenaria”, logo abaixo da estrada do Ipiranga, a jusante das caixas do Lacrimal. Essa “calha”, que mais tarde deduzi ser da adutora original das caixas do Cayguava (Velha) e Urú (Velha), era também parte fundamental do “quebra cabeça”, de onde poderia ter sido o local original da caixa Tangará.
2015 - No mês de agosto, fiz a descoberta de uma pequena caixa de captação na Sanga do Urú, abaixo de onde a adutora suspensa cruza essa Sanga. Nas extremidades da linha suspensa, a água deriva pela adutora de granito. Passei a denominar a caixa como “Urú-Velha”. Também acabou corroborando minha avaliação de que a Tangará deixou de ser utilizada por estar abaixo da nova adutora de granito.
Ainda em agosto daquele ano, acabei descobrindo outra seção da calha de alvenaria, abaixo da estrada do Ipiranga, entre a entrada para a trilha da caixa Lacrimal II e entrada para a trilha da caixa Urú. Era parte da mesma “calha” descoberta em outubro de 2013.
2016 a 2019 - Fui poucas vezes aos mananciais e o assunto da Tangará ficou “esquecido”. Retornei com mais frequência em 2020, mas dedicando-me a registrar o local da Casa da Bomba, em virtude da grande seca ocorrida naquele ano.
2024 - Só retomei as pesquisas nos mananciais nesse ano, motivado pela descoberta de novas torres de ventilação na linha da adutora, entre o Rio Ipiranguinha e a Sanga Cabra.
A vontade de esclarecer o enigma da Tangará voltou a crescer pois era a última represa que eu não havia descoberto. Em abril, fiz novas incursões até as sangas do Lacrimal, pois na minha avaliação, era o local mais apropriado para a captação das nascentes que hoje conhecemos como Lacrimal.
Na construção do aqueduto de granito em cota superior ao local da caixa Tangará em 1920, tornou essa represa sem utilidade, e novas represas foram construídas em cota superior ao do aqueduto, sendo “batizadas” naquela época como Lacrimal I e II.
Nas novas pesquisas na Calha de Alvenaria, abaixo da estrada do Ipiranga e a jusante das caixas Lacrimal, cheguei a retirar a areia acumulada no interior da calha de tijolos num pequeno trecho, para medir a profundidade da calha. Descobri ter 50cm de profundidade por 35cm de largura interna. Com a ajuda de um pedaço de taquara, realizei uma busca na parede interna da calha, do lado de onde seria a caixa, tentando encontrar um cano da captação original da caixa Tangará. Imaginei que apesar da caixa ter sido “abandonada”, o cano poderia ter ficado na calha de tijolos. Era uma boa linha de pesquisa. Mas não encontrei nada.
No mês de junho enquanto realizava uma busca pelo local original da adutora da caixa do Cayguava-Velha, acabei encontrando mais um trecho da calha de alvenaria, que foi utilizada na captação a partir da Cayguava (Velha) e Urú (Velha). A descoberta foi feita em local ao lado da estrada do Ipiranga, bem próximo da entrada para a trilha da caixa do Urú. No mesmo dia, achei uma torre de ventilação nessa calha antiga, estrutura localizada mais próxima das caixas do Lacrimal, também na lateral da estrada do Ipiranga.
Mais um detalhe importante a respeito da estrada do Ipiranga deve ser registrado: para a passagem da água das sangas do Lacrimal I e II sobre a estrada, paredes com grandes pedras mais ou menos retangulares foram erguidas na lateral da estrada, com duas linhas de manilhas de concreto embaixo das paredes, dando passagem às águas das sangas do Lacrimal.
Num primeiro momento, pensei que essas paredes poderiam ser da barragem original da caixa Tangará. Porém como as pedras só foram sobrepostas sem qualquer rejuntamento, não poderiam ter servido de contenção da água, pois haveria muita infiltração, não ocorrendo o represamento para a captação. Mas se no período em que estava sendo construído o aqueduto de granito, a estrada teve seu traçado alterado ou mesmo o caminho foi aterrado, as evidências da caixa Tangará estão perdidas.
Entre os meses de julho a dezembro de 2024, fiz várias caminhadas pelos locais onde está assentada a linha adutora, partindo da caixa do Braço do Carvalho, até as caixas dos Lacrimais, tentando encontrar algum vestígio do local da caixa, ou alguma outra nascente, cuja adução tivesse sido abandonada. Também essas pesquisas foram infrutíferas.
Faltava uma prova documental, um mapa ou relato em algum documento antigo, indicando o local que eu estava procurando. Estive na Biblioteca Pública do Paraná e no Arquivo Público do Governo do Estado do Paraná, tentando encontrar mapas da região, especificamente dos anos de 1904 a 1918, sem êxito, infelizmente. Ainda tentei contato com o Instituto de Água e Terra do Paraná, sem nenhuma resposta.
2025 - Mas o novo ano reservava surpresas: No mês de fevereiro, mantive contato com outra pesquisadora dos mananciais, a Sra. Lorena de Pauli, autora do livro “Uma História Ambiental dos Mananciais da Serra do Mar, de 2017. No livro encontrei um anexo denominado “Mapa da Zona Hidrográfica e Linha Adutora”, que me chamou a atenção. A Sra. Lorena acabou me mandando um arquivo eletrônico desse documento, o qual constatei não ser útil para a pesquisa, pois era de 1933, data posterior ao da última citação documental que eu possuía (1917).
No mesmo período, fiz uma solicitação ao Sr. Manoel Cesar Santos, responsável pelo Acervo Histórico da Companhia de Saneamento do Paraná - Sanepar, pedindo mapas relacionados a parte hidrográfica da serra. A primeira remessa do Sr. Manoel foi do mesmo mapa enviado pela Sra. Lorena. Expliquei qual era o período “certo” para minha pesquisa.
No dia 01/03/2025, o Sr. Manoel encaminhou um e-mail, com um mapa antigo sem data, mas posteriormente confirmado pelo Sr. Manoel como sendo de 1904, contendo os principais rios dos mananciais. E nesse documento, finalmente constava a indicação da sanga Tangará, onde eu sempre deduzi que estaria e as evidências de campo demonstravam: a jusante das caixas Lacrimal I e II.
Nesse documento, a sanga Tangará é formada por três nascentes que se encontram bem onde está a “calha de alvenaria”. Mais abaixo nesse mapa, a sanga Tangará acaba no rio do Mico.
Foram longos 13 anos desde a primeira descoberta que começou confirmar a desativação das caixas que estavam abaixo do aqueduto de pedra ou granito, descoberto em 2012. O mapa de 1904 confirmou o local, mas ainda falta a evidência material. Passados 108 anos desde o último registro documental da caixa Tangará, encontrar algum resquício da construção original seria espetacular!
Finalizando, ao que tudo indica isso não será possível. Faltam indícios da estrutura arquitetônica da caixa. Recentemente, conversei com um antigo morador dos mananciais - Sr. Osmair Pinto de Barros, o qual confirmou que a estrada do Ipiranga era muito mais “baixa” naquele ponto, tendo sido realizado aterro para “levantar” a estrada no local entre as caixas do Lacrimal e a “calha de alvenaria”. Este fato se confirma pela existência dos muros de pedra nas laterais da estrada.
Numa última tentativa de localizar a caixa, no dia 06/03/2025 desci o leito da Sanga Lacrimal, e acabei encontrando uma formação rochosa que no primeiro momento parecia ser o vertedouro de uma represa. Porém a localização abaixo da calha de alvenaria por onde a água captada deveria seguir para o Reservatório do Carvalho, torna o achado impossível de ser a caixa Tangará.
Portando a minha conclusão é de que a caixa Tangará foi enterrada pela elevação da estrada do Ipiranga, estando perdida para sempre.
Nas fotos adicionais, a sequência de imagens das descobertas realizadas de 2012 a 2025 e também uma representação feita no mapa de 1929, com a localização das caixas de captação, a calha de alvenaria e o aqueduto de pedra.
José Carraro – 11/03/2025